PRÁTICAS DE CONSPIRAÇÃO
O Cashball foi tudo menos uma ‘teoria de conspiração’, tratou-se isso sim de uma ação muito específica, com um propósito bem definido
Redação Leonino
Texto
24 de Novembro 2020, 11:57

O processo Cashball não surgiu do nada. Foi, antes, uma ação muito específica, elaborada a partir da segunda semana de abril de 2018, com o propósito bem definido de tentar incriminar o Sporting e o seu Presidente por práticas… que o próprio Conselho Diretivo do Sporting ignorava.

Face ao resultado já conhecido do inquérito levado a cabo pela Polícia Judiciária, torna-se hoje clara a existência de um personagem que ligava os envolvidos na ação: César Boaventura.

Diretamente envolvidos nesta prática de conspiração: Paulo Farto da Silva (Boaventura conhecia-o e tinha com ele uma relação suficientemente próxima, ao ponto de lhe apresentar e recomendar o advogado Carlos Macanjo); João Gonçalves (ex-colaborador de César Boaventura numa empresa de agenciamento de jogadores).

Indiretamente envolvido: o advogado Carlos Macanjo, que Boaventura apresentou a Paulo Farto da Silva.

De forma clara e inequívoca, a PJ e o Ministério Público têm aqui o elo de ligação entre Paulo Silva, João Gonçalves e Carlos Macanjo: César Boaventura, o qual até fez questão de explicar à PJ do Porto o seu envolvimento no caso Cashball. Não no ponto operacional (o de aliciar árbitros de andebol e jogadores de futebol, sabe-se lá a mando de quem), mas no momento de tentar dar credibilidade a um assunto que seria público em poucos dias. Ou seja, o advogado Carlos Macanjo solicitou a Boaventura (diz ele…) a publicação de um texto na página deste do Facebook, no qual colocaria em causa a honra e o bom nome de André Geraldes (diretor do futebol do Sporting), insinuando a tentativa de aliciamento a jogadores do Vitória de Guimarães. Segundo o mesmo Boaventura, o texto teria sido escrito por Macanjo. O que pretenderia o advogado com esta manobra? Fácil. Quatro dias antes (7 maio 2018) o seu cliente, Paulo Farto da Silva, concedera uma entrevista ao Correio da Manhã, supostamente a denunciar a prática criminosa de André Geraldes em nome do Sporting. Antes dessa entrevista conhecer a luz do diz (15 maio 2018), uma primeira acusação (11 maio 2018) iria dar maior credibilidade ao segundo ‘ataque’, este já a ser desferido por um órgão de Comunicação Social. Boaventura não publicou este texto de forma inocente. Ele estava ao corrente de tudo o que Paulo Silva fizera, sabia inclusivamente da entrevista dada ao CM.

Da análise ao inquérito da PJ ressalta ainda outra questão curiosa: o próprio Correio da Manhã foi apanhado de surpresa quando Paulo Farto da Silva contacta uma jornalista desse jornal, a 7 de maio, e lhe diz que quer dar a entrevista nesse mesmo dia. Ou seja, a ‘negociação’ da entrevista estava previamente acertada (20 mil euros por aquilo que denunciasse e que envolvesse o futebol do Sporting; 10 mil euros por aquilo que denunciasse e envolvesse o andebol do Sporting), mas não agendada. Percebe-se que Paulo Silva mostrava pressa em colocar o assunto na agenda pública. Mas… se toda a acção (conversa com um jogador e dois árbitros) decorreu na época 16/17, porquê esperar um ano para fazer a denúncia?

As motivações e os ‘timmings’ de Paulo Farto da Silva talvez venham a ser conhecidas no decorrer do processo que se segue, já que desta marosca ele saiu como o único arguido. Esperemos que em sede de tribunal seja possível fazer-se alguma luz sobre tudo isto.

Mas o próprio César Boaventura, cujas ligações ao ex-diretor jurídico do Benfica, Paulo Gonçalves (processo e-toupeira), também ficam claras nesta inquirição da PJ, só poderá passar ao lado de todo este processo judicial se, na verdade, uma vez mais se demonstrar que a Justiça em Portugal está refém de interesses políticos e clubísticos.

Factualmente, André Geraldes e o outro funcionário do Sporting não foram pronunciados, ou seja, acabaram ilibados, tal como João Gonçalves, de um processo que assentava em supostas mensagens trocadas por Whatsapp e que estavam no computador de Paulo Silva no formato ‘txt’, o que desde logo as devia desqualificar como credíveis (até porque não foram vistas pela PJ em nenhum telemóvel dos implicados). Mais: os ficheiros originais foram alterados em abril, cerca de um mês antes da entrevista, o que pode indiciar manipulação de textos por forma a aliciar o jornalista com uma pepita de ouro que não passava de um pedaço de ferro pintado em tons de dourado.

Enquadrado o ardil, levantemos agora algumas questões:

André Geraldes e um outro funcionário do Sporting tinham ‘criado’ um suposto esquema de corrupção para beneficiar as equipas leoninas de andebol e futebol à revelia de todos os elementos do Conselho Diretivo e da Comissão Executiva da SAD? É que a Polícia Judiciária não inquiriu, fosse em que momento ou qualidade, Presidente ou vice-presidentes do Clube. Não é estranho? Mesmo que todos afirmassem desconhecer a prática que era imputada a Geraldes, pelo menos isso ficava registado. Num caso envolvendo um outro clube (o Benfica) foi assim que se procedeu.

Serviria a acusação do processo Cashball de linha orientadora para o que meses depois seria a acusação do processo e-toupeira, ilibando Clube e acusando apenas o funcionário (Paulo Gonçalves), aceitando que os dirigentes de nada sabiam (mas pelo menos foram ouvidos…)? Dessa forma ninguém poderia acusar a Justiça de pesos e medidas diferentes… porque nem Sporting nem Benfica tinham sido pronunciados. Só que Geraldes foi ilibado e Paulo Gonçalves vai responder em tribunal. E isso faz toda a diferença.

E porque não se pronunciou o atual Conselho Diretivo do Sporting acerca desta ação maquiavélica que serviu apenas para tentar manchar a honra e o nome do Sporting Clube de Portugal, seus ex-dirigentes e ex-funcionários? Porque o Sporting ainda não foi notificado, como disse Miguel Braga, responsável pela comunicação? Bom, ou Miguel Braga foi enganado por quem lhe encomendou a desculpa ou então produziu-a da sua própria cabeça e atirou-se para fora de pé, comentando o que ignora. É que o Sporting não foi, não será, nem pode ser notificado por um processo em que não é arguido nem assistente, ou seja, não é parte envolvida ou interessada.

Sobre esta matéria, qualquer comentário oficial do Sporting será incómodo para Frederico Varandas. Porque foi ele o primeiro, a 26 de maio de 2018, ainda na qualidade de candidato a umas eleições que nem se sabia se iriam existir (a AG de destituição só foi agendada a 28 de maio de 2018…), a dar credibilidade ao processo Cashball, dizendo não acreditar em teorias de conspiração. Pior, a declaração surge em resposta a uma questão muito específica do jornalista do Expresso, sobre a ação de Bruno de Carvalho, ou seja, de forma clara Varandas não ilibava o então Presidente do processo Cashball, antes levantava a séria possibilidade de ele estar envolvido. Na ocasião, esse era o interesse de Varandas, implicar o ainda Presidente em tudo (de resto, continuou a fazê-lo depois de eleito). Desportivamente, o Sporting até poderia sair penalizado, nomeadamente com a perda do título de andebol, (só foi ilibado um mês depois) mas o que importava isso?

A armadilha que veio a ficar conhecida como Cashball começou a ser montada, na sua forma final, na segunda semana de abril de 2018. Demorou um mês a passar da teoria à prática. E os seus autores acreditaram que seria o suficiente para dar início a um processo que terminaria com o afastamento de Bruno de Carvalho da presidência do Sporting Clube de Portugal nos meses seguintes. Ligar a invasão à Academia a este acontecimento não faz qualquer sentido, porque o Cashball já estava em andamento e com data programada para ‘explodir’, antes mesmo de o Sporting jogar com o Marítimo no Funchal. E se o Sporting vencesse o Marítimo a invasão do dia 15 de maio de 2018 nunca teria acontecido.

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