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É POSSÍVEL VENCER SEM ABDICAR DA HONRA, DA DECÊNCIA, DA INTEGRIDADE…
O presidente Frederico Varandas não tem de ser fofinho e dizer coisas politicamente corretas. O presidente do Sporting Clube de Portugal tem de falar para os sportinguistas, em defesa do Sporting.
21 Mai 2021, 12:51

“Hoje é daqueles dias em que os avós, os pais, podem chegar a casa e dizer aos seus netos e filhos que os do bem também têm força, também têm coragem, resiliência. E sobretudo que também ganham. Que é possível vencer sem abdicar da honra, da decência, da integridade, da transparência e da nobreza do desportivismo. Isto é Sporting Clube de Portugal”.

Frederico Varandas, discurso na Câmara Municipal de Lisboa, 20/05/2021

Ainda é tão difícil escrever sobre isto tudo, sobre o tanto que sentimos, sobre o tanto que libertámos… é quase indescritível este aperto que sinto sempre que aproximo os dedos do teclado para escrever sobre o título. Acho que mesmo as palavras mais inspiradas não conseguem estar à altura do sentimento pessoal e coletivo que nos invadiu, enquanto sportinguistas.

Estava lá, a festejar o título de campeão nacional 1999/2000, que pôs fim a um longo jejum de 18 anos. Antes, festejei ainda, criança, os títulos conquistados em 1980 e 1982, era ainda o tempo mágico de Manuel Fernandes e Rui Jordão, entre tantos outros, e inocentemente pensava que o Sporting ia ganhar quase sempre.

Mas depois, ao longo dos anos 80 e 90, vi os jogadores do FC Porto a perseguirem e agredirem árbitros dentro do campo e à frente das câmaras de TV, sem qualquer vergonha e de forma impune. Ouvi as escutas do apito dourado, em que um fulano que é presidente de um clube há mais de 40 anos nos surgiu altamente envolvido e comprometido em esquemas de batota e corrupção. E foi nessa altura que entraram para o léxico futebolístico nacional expressões tão famosas como: “quinhentinhos”, “café com leite”, “fruta” e etc.  Em resumo, e traduzindo essas expressões para linguagem mais corrente, batota e corrupção. E assim o FC Porto alcançou e manteve o seu longo período de hegemonia no futebol português.

Depois, em 1999/2000, veio o tal quebrar do jejum pelo Sporting para, logo no ano seguinte, vermos o Boavista ser levado completamente ao colo até ao título de campeão nacional, prejudicando o Sporting. Era já Paulo Gonçalves, então nos axadrezados, a refinar o trabalho que aprendera no FC Porto e que traria, depois, para o SLB.

Mas, em 2001/2002, o Sporting volta a ser campeão. Acreditámos que era possível, que o futebol português ia deixar ganhar os melhores daí para a frente, que os esquemas de batota, as teias de influências, a podridão, iria ficar definitivamente afastada. Só que não.

Começa a surgir o grande monstro. Os emails substituem as escutas. As “missas”, os “padres”, os “vouchers” ou as “toupeiras” renovam o léxico da batota dos anos 80 e 90. O centro dos poderes obscuros desloca-se da região Norte para Sul da segunda circular.

Nós estávamos lá e vimos tudo: a falta de Luisão sobre o guarda-redes Ricardo em 2005, na Luz, que beneficiou o nosso adversário e nos retirou o campeonato; o golo com a mão de Ronny, do Paços de Ferreira, em Alvalade, em 2006/2007. Toda a gente viu. Incluindo o árbitro, que simplesmente decidiu não sancionar. Custou-nos um campeonato nacional.

Façam então as contas: o Sporting foi campeão em 2000. Em 2001, acabou por não ser, por causa do colinho escandaloso ao Boavista. Em 2002, voltou a ser. Sem erros de arbitragem, devia também ter sido campeão em 2005. E em 2007.

Teríamos então, se houvesse justiça e lisura no futebol português, se não fossem os erros escandalosos de arbitragem que nos prejudicaram, o Sporting campeão em 2000, 2001, 2002, 2005 e 2007.

Mas há mais. A bola no peito de Pedro Silva, na final da Taça da Liga de 2009, que Lucílio Baptista converteu em mão e penálti para o Benfica. Mais um troféu que nos foi roubado.

Estes são os erros escandalosos de que me lembro de cabeça, sem sequer fazer qualquer pesquisa. Houve mais, com certeza.

Mas também há o fatalismo, o fado, os erros próprios, a má fortuna.

Quem não se lembra da final da Taça UEFA em Alvalade, em 2005, com o CSKA? Rogério, com a baliza escancarada, atira ao poste e falha o empate a 2-2 e, na resposta, em contra-ataque, o CSKA faz o 3-1, com a ajuda do nosso guarda-redes Ricardo. Eu estava lá. Lembro-me. Nunca mais me esqueço.

E, ainda mais recentemente, em 2015, no jogo do título em Alvalade, quem não se lembra do falhanço do Bryan Ruiz, que muito provavelmente nos custou o título de campeão (esse falhanço e o escandaloso colinho para os outros ao longo de toda a prova, claro?)

Nós, sportinguistas, vimos isto tudo. Nós vivemos isto tudo. Nós chorámos isto tudo.

Sim, afundámo-nos também em tantos erros próprios.

Mas vivemos isto tudo, e nunca desistimos. Nunca deixámos de acreditar.

Sim, tivemos um sétimo lugar. E estávamos lá, mais de 30 mil no estádio. Nunca desistimos.

Sim, os “sistemas” tudo fizeram – e fazem, e vão continuar a fazer – para o Sporting não ganhar.

E sim, faz hoje 10 dias, na terça-feira, dia 10 de maio de 2021, o Sporting recebeu em sua casa e venceu o Boavista e sagrou-se Campeão nacional de futebol.

E nós abraçámo-nos todos uns aos outros. Saltámos. Gritámos. Cantámos. Rimos. Chorámos. Saímos à rua até às tantas. Festejámos. Celebrámos. Lembramo-nos, muitos de nós, de todos os sportinguistas que já não estavam cá para ver. Eles contam. Contamos todos. Em cada leão, um campeão.

Fizemos a festa nessa noite, como deve ser feita, com leões entre leões. Foi a nossa festa, aquela que surpreendeu muita gente, porque eles nem imaginavam que ainda tivéssemos esta força, esta juventude, esta raça, este querer, esta alegria.

E muito bem esteve o presidente do Sporting nesse dia de festa. Calado. Disse apenas, quando os jornalistas se aproximaram: “não, a festa é deles, dos jogadores, dos técnicos, eles é que são os heróis”. Perfeito. A festa foi deles, foi nossa, é nossa.

Na Câmara Municipal de Lisboa, não houve qualquer festa, o povo foi mantido à distância.

Na Câmara, registou-se um momento político, um momento em que tinha de ser dito o que tem de ser dito. Na Câmara, o Presidente não tinha de ser bonzinho e dizer coisas bonitas e cheias de fairplay. O presidente Frederico Varandas não é o presidente de todos os portugueses. O presidente Frederico Varandas não tem de ser fofinho e dizer coisas politicamente corretas. O presidente do Sporting Clube de Portugal tem de falar para os sportinguistas, em defesa do Sporting. E foi o que fez. Chamou os bois pelos nomes, elogiou atletas, técnicos e dirigentes, falou para os sportinguistas, lançou pontes para a união, apontou as dificuldades do futuro, porque vão continuar a dificultar a vida ao Sporting.

Um bandido será sempre um bandido, e todos os bandidos serão sempre bandidos. E devem ser apontados a dedo, sem medo, neste país de “respeitinho”, de “salamaleques”, em que um vigarista, seja ele qual for, acha que pode andar na rua de cabeça erguida, sem ser apontado a dedo por aquilo que é: um vigarista.

Isto é mais que futebol. Isto é mais que desporto.

Eu disse às minhas filhas, enquanto festejávamos nas ruas, quando o Sporting se tornou campeão, coisas parecidas com esta: “É possível vencer sem abdicar da honra, da decência, da integridade, da transparência e da nobreza”. No futebol, como na vida.

Somos o Sporting Clube de Portugal. Vencemos. Com valores. Com ética. Com Esforço. Com enorme Dedicação e Devoção. Com honra. É possível. É sempre possível. Os nossos filhos sabem pelo exemplo que tentamos ser, que tentamos dar. E sabem também, agora, pelo futebol. Pelo Sporting. O Sporting somos nós. Nós somos Sporting.

Obrigado. Obrigado. Obrigado

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