A nossa Academia é, sem dúvida, um dos nossos maiores ativos e, nesta recessão que iremos viver pós-pandemia, terá de ser o nosso alicerce.

Ao longo dos anos, sempre foram identificados, educados e trabalhados muitos dos melhores jogadores do mundo provenientes da Academia do Sporting.

Tem o selo de qualidade da nossa Academia a nossa maior figura, Cristiano Ronaldo, que é o melhor jogador de todos os tempos do futebol profissional.

Oiço e leio, muitas vezes, que a Academia do Sporting faz bons jogadores, contudo, faz maus homens; discordo, visto que o Cristiano Ronaldo e família, ao longo dos anos em que sempre estiveram no topo do futebol mundial, sempre tiveram um orgulho imenso em ser Sporting, e foram inúmeras as ocasiões que agradeceram publicamente a importância que o Sporting teve nas suas vidas a todos os níveis e o enorme orgulho que têm em ser do Sporting Clube de Portugal.

Isto é ter verticalidade, ser sério, ser agradecido. No essencial, ser boa pessoa, e por mais que se ensine isso, é uma questão de caráter que infelizmente muitos não têm.

Posto isto, esta breve apresentação, usando apenas o nome de Cristiano Ronaldo, estrela-maior em todos os sentidos, que representa na perfeição os valores do Sporting, vou fazer uma análise mais profunda do que é, e o que deverá ser, a Academia do Sporting.

Infelizmente, porque as pessoas não são imortais, e tudo na vida tem o seu momento, o grande responsável pelo sucesso desta Academia, Aurélio Pereira, já não está ativamente ao serviço do clube. Ele é, de facto, o rosto do sucesso da Academia, foi ele que a criou à sua imagem, e é a ele a quem devemos todo o sucesso dela.

É por isso, para mim, um grande mistério o porquê de nunca se ter feito uma grande homenagem, por todos os anos de vida que dedicou ao seu grande amor, e todo o know-how que deu a esta Academia e, para os mais materialistas, todo o dinheiro que deu a ganhar ao nosso Sporting.

A vida tem de ser dar e receber, e um dos mais nobres gestos, é o reconhecimento.

E este é o reconhecimento de uma vida dada em prol de amor: o Sporting Clube de Portugal.

Nos últimos anos é um clichê ouvir todos os candidatos à presidência do Sporting, discurso que após a eleição se vai diluindo ao longo do mandato, que a Academia do Sporting tem de ser o alicerce do Clube.

Não só o discurso se vai diluindo ao longo do mandato, como vemos que são efetuadas compras de jovens jogadores muitas vezes inferiores aos que temos na Academia, sem nunca percebermos a lógica de tais operações.

No cerne da questão, tem de ser discutida a política da Academia do Sporting e qual o motivo para termos perdido a hegemonia, no que se refere à qualidade dos jogadores que conseguem chegar ao futebol profissional e conseguem vingar na equipa principal.

Não é líquido que a melhor formação seja a que ganha, pelo simples facto de existir em cada escalão dois anos. Se usarmos os miúdos do segundo ano num campeonato, estamos mais perto de ganhar a competição, contudo, o maior desenvolvimento dos jogadores acontece se jogarem com jogadores mais velhos, e isso acontece se jogarmos com mais jogadores de primeiro ano.

Uma análise simples, em termos gerais

i. Localização da Academia:

Já todos nós tivemos 13, 14, 15 anos e, se fizermos uma breve viagem ao passado, entendemos que, nestas fases, não gostávamos de estar presos.

É isso que neste momento acontece na Academia do Sporting. Os miúdos que jogam no Sporting com tenra idade não têm carro e a Academia fica no meio do nada, fica longe do centro urbano, não existem transportes para se poderem deslocar a um centro comercial ou dar um passeio. Por ser longe, as visitas dos familiares dos amigos também não são constantes, o que dificulta muito o processo. É uma prisão.

E se há dez anos esses miúdos perceberiam que para ter sucesso teriam de jogar na Academia do Sporting, hoje factualmente não é isso que acontece. Sabem que podem ter sucesso formando-se em outros clubes, e concretamente no maior rival do nosso Clube, que tem uma academia dentro de um centro urbano que dá aos miúdos uma liberdade diferente.

No momento da decisão esta premissa tem muito peso. É essencial reavaliar-se se faz sentido termos a Academia onde se encontra neste momento. A atual Academia pode ser rentabilizada para ser alugada a clubes de todo o mundo, que pagam fortunas para fazerem estágios.

ii. Os Pais

A maioria dos pais vê nos seus filhos um promissor boletim do Euromilhões. E desde cedo, tentam lucrar da forma que podem com o dom dos seus filhos. Muitos clubes, visto que os jovens só podem ter contratos profissionais a partir dos 16 anos, fazem contratos com os pais, de forma a manterem os seus filhos a jogar no clube em troca de um valor pré-acordado.

Sabemos que esta prática é ilegal, contudo é uma prática recorrente – tenho informações que o Sporting não a usa – e, por isso, muitas vezes perde jogadores para rivais.

Esta prática tem de ser denunciada, porque se não for, será difícil competir com os outros. E o que faz girar o mundo é o dinheiro, será sempre o dinheiro.

iii. Importância das Figuras do Sporting na mensagem aos jovens

A mensagem de Ser Sporting que tem de ser passada a toda a nossa formação tem de ser dada por aqueles que representem a nossa identidade e os nossos valores. Para exemplificar, eu tenho sido um crítico nestes e em outros espaços em relação ao Beto Severo. Não vejo que o Beto esteja vocacionado para a posição que neste momento ocupa. Sei sim, que Beto foi um exemplo enquanto atleta e capitão do Sporting e que representa a nossa identidade e os nossos valores.

Para mim é inquestionável. Para mim é absolutamente inquestionável que o Beto, enquanto uma das maiores figuras do Sporting, seja uma das figuras que tem de passar a mensagem aos miúdos, aos nossos jovens jogadores. Quem melhor que Beto ou Sá Pinto? Jogadores que estes jovens viram a jogar, que são os seus ídolos.

Temos poucas referências, temos de as preservar e têm de ser estas referências a passar os nossos valores. Não faz sentido colocá-las na boca do lobo para que a sua imagem fique manchada. Temos de preservar a nossa história e os nossos. As nossas figuras não podem servir para fazer política, tem de estar a servir o Sporting independentemente de ser o Presidente A, B ou C.

iv. Rede de recrutamento

A nossa Academia, a nível de rede de recrutamento continua a ser de excelência, com excelentes profissionais que no terreno detetam as maiores valias a nível nacional. Contudo, essa excelência acaba por não se materializar como no passado.

Esse facto deve-se à falta de investimento e de agilidade na tomada de decisão pelo facto de, neste momento, haver um vazio na liderança, já que Aurélio Pereira não está ativamente ao serviço do clube devido à sua idade.

v. Padrão de formação – Estilo de Jogo

O padrão da formação terá de ser delineado, e terá de ser seguido por todos os treinadores desde a formação até ao futebol profissional. Acredito que o Sporting tenha de ter um estilo de jogo definido, e que sejam trabalhados todos os aspetos técnico-táticos em todos os escalões, com o objetivo de os jogadores chegarem aos juniores e terem as valências do que deverá ser um jogador Sporting, em cada uma das posições.

Temos toda a formação para incutir um estilo de jogo, temos toda a formação para identificar jogadores que se adaptem a um estilo de jogo. Não faz sentido estarmos a formar durante dez anos, e ser contratado um treinador que não aposta neste ou naquele jogador porque não se adapta à sua forma de jogar.

É utópico dizer que a forma de jogar terá de ser sempre a mesma, mas é fundamental que as variações táticas e pedagógicas ao longo das várias etapas tenham como objetivo final um produto identificado a nível técnico, tático, psicológico e físico.

Agora mais do que nunca, e muito mais do que mudar colchões, é necessário, a nível estrutural, serem tomadas decisões para que num curto espaço de tempo, a Academia do Sporting seja o alicerce do Clube.