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AS CONTAS E O ORÇAMENTO
Parece-me evidente que não se trata de um voto leviano de quem não gosta da direcção. Creio que os números demonstram de forma muito evidente sinais que merecem preocupação.
Imagem de destaque02 Out 2020, 10:04

No passado dia 26 de Setembro, os sócios do Sporting Clube de Portugal expressaram o que pensam da gestão do actual CD.

Rapidamente, se alinharam comentários no sentido de explicar que a consequência é nenhuma e para apresentar algumas justificações, que foram desde a mobilização das claques até à ignorância de quem votou matérias tão técnicas.

Tenho dúvidas que as claques sejam responsáveis pelo resultado mas, mesmo que o fossem, estamos a falar de associados de pleno direito do Sporting Clube de Portugal. O facto desses associados pertencerem a uma ou várias claques não lhes confere nenhuma redução de deveres, nem de direitos. Bem ou mal, muitos dos elementos das claques são associados e têm a faculdade de exercer os direitos reconhecidos estatutariamente da maneira que entenderem.

A ignorância dos sócios que votaram o orçamento e as contas é um óptimo argumento, que vale num sentido e no outro oposto. Se tivessem aprovado as contas, os sócios não seriam mais conhecedores dos detalhes técnicos. Seriam, isso sim, ignorantes convenientes a quem quer fazer aprovar documentos com cariz técnico tão complexo.

A consequência do chumbo das contas e do orçamento, contrariamente ao que se quer fazer crer, não é inócuo, nem inexistente. Se é verdade que nenhum CD perde o mandato por essa razão, pode perdê-lo em função do que fizer daí em diante e nos termos que os estatutos determinam para uma área tão específica como é a gestão económica-financeira (artigo 31º dos estatutos).

Só com o voto favorável da Assembleia Geral é que os orçamentos podem ser deficitários. Os números 3, 4 e 7 do artigo 31º dizem o seguinte:

Artigo 31º

3 – Fora dos casos previstos no presente Artigo e salvo se a Assembleia Geral expressamente deliberar de forma diferente, os gastos e investimentos realizados não poderão exceder, em cada exercício económico, o total dos rendimentos obtidos.

4- A realização de gastos e investimentos que impliquem um défice superior ao que foi orçamentado, carece de autorização da Assembleia Geral, sujeito a parecer prévio do Conselho Fiscal e Disciplinar.

7 – Salvo se outra decisão for tomada em Assembleia Geral por maioria de, pelo menos, dois terços dos votos expressos, a violação por parte do Conselho Directivo do disposto no número 4, implica a perda imediata dos mandatos por parte dos seus membros e a impossibilidade de, durante sete anos, qualquer desses membros poder desempenhar qualquer cargo nos órgãos sociais do SPORTING CLUBE DE PORTUGAL.

É certo que, até à data, não se manifesta a previsão do artigo 31º dos Estatutos.

Mas é igualmente certo que a gestão do Clube, nestes últimos 2 anos, traduziu-se numa acentuada quebra dos resultados financeiros, que passaram de resultados positivos superiores a 2M€/ano, para um resultado positivo de 141 mil euros, em 2018/2019, e de 74 mil euros, neste último ano (o que foi votado).

Parece-me evidente que não se trata de um voto leviano de quem não gosta da direcção. Creio que os números demonstram de forma muito evidente sinais que merecem preocupação. Goste-se ou não do carácter eclético do Clube, esse elemento está presente desde a data da sua fundação e na sua história. As modalidades extra-futebol trouxeram ao Clube um estatuto internacional e olímpico que tem que ser cuidado. Da parte do actual CD nunca se ouviu dizer que tinham a intenção de menosprezar as modalidades, pelo que assumo que perfilharam a ideia de ecletismo desde o seu início e que tal natureza em nada transtorna a gestão do Clube nem a da SAD.

Se há um incremento de investimento nas modalidades suportadas pelo Clube, então, tem de se verificar uma correspondência no sucesso desportivo. Esta direcção “herdou” um Clube que foi vencedor em todas as modalidades de pavilhão que desenvolve. No primeiro ano de mandato, não obstante o sucesso europeu no futsal e no hóquei patins, o Sporting não foi capaz de revalidar nenhum dos títulos obtidos no ano anterior.

O que não podemos é assistir a um mesmo padrão herdado do futebol, dito de investimento, com resultados financeiros modestos e sucesso desportivo reduzido (ou nulo), nem a um discurso maleável que defenda uma ideia e o seu contrário, em função do contexto.

Assim, resulta para o CD um especial dever de cuidado na execução do orçamento que vier a ser aprovado ou que venha a ser executado em regime de duodécimos. Também espero que o CD não ponha em cima dos ombros dos sócios a responsabilidade do que possa correr mal. É que, se não estão contentes com a censura que esta votação demonstrou, mais vale retirarem as devidas ilações “políticas” do mesmo acto. É esta a normalidade da vida.

Ontem, os Sportinguistas viveram mais uma noite de pesadelo, no futebol. Mais significativo do que o elemento emocional, associado ao resultado vexatório, é o impacto que isso terá nas contas da SAD. Não caímos aos pés de um colosso futebolístico, nem de nenhum obstáculo inultrapassável. E isto revela o que ainda se vai fazendo mal no futebol. Não sei a que alegrias se referem os responsáveis, quando dizem que ainda as teremos. Pela parte que me toca, empatar ou ganhar ao Benfica não é tema que me suscite especial gáudio, se tal for acompanhado de um quarto lugar (ou de pior). Longe vai o tempo de discursos do nível do “há que levantar a cabeça” pelo que é tempo de mostrar trabalho de relevo, sem o escudo de qualquer justificação que, a brincar, a brincar, faz desta época o terceiro “ano zero” e não sei se pode haver mandato que seja caracterizado por ter três anos de mandato catalogados dessa forma.

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