Rita Garcia Pereira
Biografiado Autor

23 Jan 2020 | 08:00

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Rita Garcia Pereira

Do outro lado da barricada, ao que se sabe, assim que alguém se apresenta a julgar seja o que for, é logo brindado com convites.

É habitual os Sportinguistas queixarem-se sistematicamente das arbitragens, tendo até um antigo Presidente, à data em funções, aludido a um determinado “sistema”, dando a entender que se referia a esta realidade. Imaginemos que existe um diferendo de anos entre um árbitro e uma adepta de um determinado clube de futebol, seja ele qual for, diferendo esse que segue pela via judicial, com o primeiro acusado de ofensas à integridade física daquela, em circunstâncias que não dignificariam um qualquer homem e, menos ainda, um que se exige ser imparcial. O pano de fundo seria, imaginemos também, discordâncias sobre decisões tomadas em jogos anteriores do dito clube, sendo que a adepta em causa foi, também e previamente, condenada por injúrias.   Imaginemos agora e por último que, por um mero acaso do destino, o mesmo árbitro “saiu na sorte” em dois jogos muito importantes do clube dessa adepta, o último dos quais ocupando a posição de assistente do VAR. Curiosamente, o VAR acabou por ter uma decisão que, legítima ou não, se veio a revelar determinante no evoluir do jogo e com manifesto impacto no resultado final. Chegados aqui, conseguimos acreditar que este árbitro está em posição suficientemente isenta para julgar e tomar decisões em condições de total imparcialidade? Podemos dizer que sim, da mesma forma que podemos, já adultos, acreditar no Pai Natal ou nada saber sobre a natureza humana. Uma pessoa crispada por processos judiciais em curso, onde figura como arguido e cuja génese é o exercício da sua actividade em jogos do Sporting, não está em condições, pelo menos psicológicas, para ter uma conduta absolutamente imparcial. Dito isto e independentemente de quem tenha razão no dito litígio, a verdade é que, na sua pendência, não faz sentido manterem-se nomeações, da mesma forma que não é aceitável que, com o grau de complexidade da regulamentação aplicável, inexista um regime de garante da imparcialidade. Costuma dizer-se que não basta ser-se sério, sendo igualmente necessário parecê-lo. Às vezes, acrescento eu, fazer por o parecer é o início do percurso que tem de ser feito.  Sem prejuízo da presunção de inocência, tão aplicável aqui como noutra sede qualquer, compete ao Conselho de Arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol até proteger tais profissionais, não nomeando árbitros com litígios judiciais conhecidos. Por seu turno, à Federação compete mais, como seja o de estabelecer o limite e esclarecer as regras do jogo, nomeações incluídas, de forma clara. Não é o que tem recorrentemente sucedido, sendo que a falta de regulamentação provoca, ademais, a impossibilidade de reacção em tempo útil. É certo que aqui o prejudicado será o nosso clube mas, a longo prazo, o que se penhora é toda a credibilidade de um sistema que já está minado por dúvidas. No meu alegado exemplo não há, creio, coincidências. Nem quanto ao facto de a adepta em causa ser mulher, nem quanto ao facto de o Clube da mesma ser o Sporting Clube de Portugal. Do outro lado da barricada, ao que se sabe, assim que alguém se apresenta a julgar seja o que for, é logo brindado com convites. Quando não para jogos, pelo menos para ir conhecer os recantos à casa. Já agora e de uma vez por todas, isso também tem que acabar.


A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.


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