E O JOGO? FOI BOM?

Estar sistematicamente a dissecar o jogo pelo lado da arbitragem já enjoa, até porque no final quem se lixa é o mexilhão

22 Dez 2020 | 09:49 |

Percebemos que o ambiente do futebol português já está muito perto da demência quando aceitamos entrar numa rotina que nos leva a dissecar um jogo (seja de Sporting, Benfica ou FC Porto) sistematicamente pelo lado da arbitragem, fazendo por esquecer, de forma hipócrita, que no final quem acaba sempre por se lixar é o mexilhão. Nesta última jornada, as ‘dores’ de Farense, Gil Vicente e Nacional não interessaram a ninguém, a não ser aos poucos milhares de adeptos que seguem estas equipas. Quando os adeptos (ou máquinas de propaganda) dos grandes entram em ação é apenas para atirar lama uns aos outros. E sim, esta semana todos têm razão ao atirar alguma. Fosse porque Coates e Gilberto deveriam ter sido expulsos, fosse porque deixar passar em claro a falta que existe antes do segundo golo portista é apenas ‘mais um dia no escritório’.

Os adeptos do meu clube costumam passar por cima destas situações argumentando que já fomos prejudicados durante tantos anos que por mais pequenas ajudas que nos sejam dadas, as mesmas ainda não são suficientes para acertar as contas. São mais ou menos três décadas de erros contra. Já os portistas justificam que andaram 18 anos a levar com ‘calabotes’. E por seu lado o Benfica lembra a ‘fruta’ podre que os afastou de títulos durante um período que vai desde os inícios da década de 1990 até meados da primeira década do século 21. É assim, há sempre algo para justificar ‘pequenas’ ajudas.

No meio desta ‘guerra sem quartel’ existiram e existem imensas vítimas colaterais, das quais ninguém quer saber. O futebol português é isto, ainda que embrulhado em galas que o tentam pintar como sério e profissional. Para a Liga, por exemplo, equilibrar contas passa pela centralização dos direitos de TV, isto é, dar mais uns milhares aos pequeninos para os manter calados quanto ao escândalo que é a forma de disputa da Taça da Liga, prova desenhada para ter nas meias-finais os quatro principais clubes portugueses da atualidade, afinal os únicos jogos pelos quais os patrocinadores aceitam pagar dinheiro que se veja. A FPF, que durante muito tempo foi um farol nestas matérias, também já se vergou a outro tipo de interesses. Mas para que tudo corra bem, há que ter sorte. E isso não tem faltado ao organismo liderado por Fernando Gomes. Então não é que em três anos, os sorteios da Taça de Portugal coincidiram em abrir caminho aos mesmos quatro principais emblemas para se encontrarem apenas nas meias-finais (se forem competentes)? Puro sortilégio, digo eu… (quais as probabilidades de tal acontecer?)

Voltando à jornada. Explicar a forma muito competente como o Farense quase travou o Sporting; demonstrar que o Gil Vicente, mesmo reduzido a dez, chegou a banalizar o Benfica; ou confirmar que o FC Porto continua a ganhar sem conseguir revelar um nível de jogo superior aos adversários, é dispensável. Ninguém quer saber. Os grandes saíram com os três pontos e o Natal vai ser mais feliz.

Como eu gostava de olhar para o futebol dessa forma hipócrita. Mas não consigo. Preferia uma Liga com os grandes a perder mais pontos sempre que fossem incompetentes. Essa exigência, sim, elevaria o nível do futebol português. Não os constantes acertos de calendário e as constantes análises de arbitragem que inclinam os campos quase sempre no mesmo sentido.

Feliz Natal para todos.

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