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0Assisti com natural atenção à tão anunciada reportagem que a TVI transmitiu ontem no Jornal da noite que versou sobre a investigação que a Polícia Judiciária conduziu sobre os vouchers ou kit Eusébio”. No período em que exerci funções como dirigente do Sporting e que acompanhei de perto a equipa de futebol, tendo presença assídua na denominada “zona técnica”, apercebi-me da forma de atuar dos nossos rivais, com especial incidência no Sport Lisboa e Benfica. Temos que nos reportar à data dos factos. Quando a “caixa” nos chegou de forma anónima, já estávamos identificados com o tema, tal como todos aqueles Clubes que têm uma estrutura para o futebol, coisa que o Sporting Clube de Portugal hoje não tem mas isso é análise para outro momento. Ora, à data, o Conselho de Arbitragem, liderado por Vítor Pereira e Ferreira Nunes, afirmou desconhecer a existência destes vouchers. Ou seja, como sabemos, o então Conselho de Arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol que se manteve até Junho de 2016 e, é sabido, tinha uma proximidade assinalável com o Sport Lisboa e Benfica, como o demonstram as presenças assíduas de Ferreira Nunes nos camarotes da Luz. É espantoso como os dirigentes da arbitragem de então não soubessem que, em 38 jornadas entre a Luz e o Seixal, fossem oferecidos durante 3 anos cerca de 2.280 jantares aos seus árbitros e observadores… Ontem senti pena alheia pela forma como o moderador e as duas criaturas, que não são benfiquistas mas fanáticos lampiões, convidados a comentar, branquearam a própria peça jornalística que acabavam de apresentar. A referida peça, por sua vez, tinha já de si várias falhas. Primeiro, não estamos a falar de sete jantares/almoços. São quatro almoços/jantares por interveniente, por jogo, a saber: Árbitro Principal – oferta de 4 jantares Árbitro assistente n.º 1 – oferta de 4 jantares Árbitro assistente n.º 2 – oferta de 4 jantares 4.º Árbitro – oferta de 4 jantares Delegado da Liga 1 – oferta de 4 jantares Delegado da Liga 2 – oferta de 4 jantares Observador dos Árbitros – oferta de 4 jantares Ou seja, o Sport Lisboa e Benfica oferecia por jogo 28 jantares num restaurante de luxo no Terreiro do Paço, em Lisboa, para os intervenientes no jogo ou para quem estes indicassem. Amigos, familiares, eventuais clientes a quem quisessem agradar. Para isso cada voucher tinha um número identificativo, número esse que tinha que ser referido à relações públicas do SL Benfica para que esta fizesse a reserva. A pessoa que quisesse ir jantar tinha que se identificar e naturalmente passaria a estar de alguma forma, mesmo que no seu subconsciente, condicionada ao SL Benfica. É um facto que a grande maioria dos árbitros, delegados ou observadores não os utilizaram. Qual a razão de não os utilizarem? Alguns por desconhecimento da existência do voucher dentro da caixa ou para o que este servia, mas muitos outros porque sabiam o que implicava aceitar esta oferta. O voucher não tinha qualquer restrição. O convite era aberto a quem o utilizasse e sem limite quanto ao consumo. Logo é falso, completamente falso, o argumento do “prato do dia” e o limite dos 35 euros por pessoa, por refeição, que o SL Benfica apresentou como justificação e desculpa ao fim de 15 dias de rebentar o escândalo. É tão falso que, tanto quanto se soube ontem, a Polícia Judiciária e – muito bem – apurou a inverdade das declarações do SL Benfica. A TVI tinha obrigação de fazer bem o seu trabalho jornalístico e apresentar uma peça rigorosa, coisa que não soube ou não quis fazer, desaproveitando uma excelente oportunidade. Mais ainda, a TVI não soube apurar que à data da denúncia em directo do Presidente do Sporting CP, o SL Benfica já não oferecia os vouchers, no Estádio da Luz. Apenas os oferecia no Seixal, nos jogos da equipa B. Curiosamente o SL Benfica, após a denúncia do Sporting Clube de Portugal, retomou a oferta dos vouchers nos jogos do Estádio da Luz. Porquê? Para atabalhoadamente tentar demonstrar uma normalidade que em nada era normal. O que é que aconteceu depois disso? Em primeiro lugar ninguém mais voltou a utilizar qualquer voucher. E porquê? Se não tinha mal nenhum? Em segundo lugar, o kit Eusébio com a oferta do voucher foi descontinuado… Recordo-me de um episódio em que, comentando este assunto da oferta dos vouchers aos nossos parceiros da Major League of Soccer (americanos), a resposta imediata dos mesmos foi: “You can´t do that!!”. Ou seja, qualquer agente desportivo, sobretudo de países civilizados onde a ética desportiva impera, estas práticas de submundo não são toleradas e são severamente punidas. A outra falha da peça da TVI, e cujo branqueamento feito posteriormente pelo moderador e comentadores me deixou ainda mais perplexo, prende-se com a colagem às boas práticas da UEFA. Ora esta instituição e estes procedimentos que conheço porque os vivi durante quase seis anos, em nada se aproximam desta pouca vergonha. A UEFA aceita como válidos artigos de merchandising, de teor simbólico como uma camisola, uma caneca, uma caneta, um boneco de peluche ou outros que o Clube tenha na sua Loja. O valor limite de 300 euros é aplicado para que outros artigos que Clubes ricos pudessem oferecer como relógios, salvas de prata, gadgets, entre outros artigos similares, sejam excluídos. Não foi por acaso que o SL Benfica batalhou, através de Paulo Gonçalves, que nos regulamentos da Liga Portugal não figurasse nenhum valor para ofertas e o Sporting Clube de Portugal, cujo representante era eu, conseguiu aprovar na Assembleia Geral da Liga o valor de 150 euros como limite para ofertas, que ainda está em vigor. Também aqui se demonstra a falta de rigor da peça da TVI. O SL Benfica – e basta consultar as actas e as gravações das Assembleias Gerais da Liga de Clubes – não queria impor limites para conseguir ultrapassar este constrangimento, mas os Clubes Portugueses e muito bem entenderam o contrário. Uma última nota, para ser justo, para o programa posterior da TVI 24 em que Miguel Guedes e José Pina tiveram e utilizaram bem o contraditório e onde o respeito pela verdade desportiva imperou.
Fotografia de Record